quarta-feira, 18 de agosto de 2010

As Barreto (II)

Um dia, num Domingo, no fim da missa da catequese encontrei a Zeza na pastelaria.
Estava toda vestida de preto e muito triste.
Perguntei-lhe porque estava assim. De preto e triste.
Enquanto tirava o papel a um gelado, respondeu-me: 'Foi a minha irmão Nanda que faleceu!'
Por muitos anos que viva, nunca hei-de esquecer nem este momento nem o que senti, ou não senti, naquele momento. A Nanda tinha morrido! A Nanda só tinha dez anos. As crianças não morrem!-pensava eu!
Senti-me presa ao chão, como se dali não conseguisse sair mais. Comecei a ver a Nanda, a vê-la trepar às árvores, a aparecer e desaparecer. Consegui perguntar: Como?
'Caiu da bicicleta, bateu com a cabeça na beira do passeio e teve uma fractura craniana...'-Respondeu-me, enquanto ia apontando para a parte da cabeça onde ela tinha batido, a frente.
Pois a Zé andava muitas vezes numa daquelas bicicletas, vulgo pasteleiras. Era enorme, a bicicleta, muito maior que ela. Seria de um dos irmãos, ou do pai, talvez. Andava bem, tão bem como os rapazes. Ela fazia tudo que os rapazes faziam, e fazia-o tão bem, ou melhor que eles.
E foi traída por essa sua faceta.
Não sei se a Zeza me disse mais alguma coisa. Não sei o que se passou de seguida. Não se também se estava acompanhada ou não. Assim como o momento da notícia me ficou gravado na memória até ao mais infimo pormenor (era capaz de descrever como era a roupa da Zeza naquele dia... e até sei que o gelado era um Super Maxi), não sei como foi o resto, só que os dias que se seguiram andei sempre com a Nanda no pensamento. Via-a a andar de bicicleta, a tombar, cair e bater com a cabeça na berma do passeio. Via-a também a limpar a testa (não sei se abriu ou não) e a continuar caminho...
Foi assim que descobri que as crianças também morriam!

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